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Ela foi para o MIT depois de não ter passado no ITA

Nathalia Bustamante - 31/10/2016
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Por Nathalia Bustamante

Desde pequena, a santista Clarissa Forneris sabia que se interessava pelas ciências exatas – em especial, a Química. “Fiquei fascinada em como a química entende um pouco de todas as ciências e, além disso, pode ser aplicada em todas elas”, explica. Filha de engenheiro, sempre ouviu falar do MIT – Massachussetts Institute of Technology – como uma referência, mas sempre uma referência distante. “Na época não tinha muito isso de estudar fora, e até então eu só tinha ouvido falar de uma pessoa que tinha feito o application”, relembra.

Ao concluir o Ensino Médio, sua primeira opção de universidade era o ITA. Fez o vestibular para a USP e para o ITA e, como ainda não estava 100% certa de que engenharia seria a sua área, decidiu também enviar sua candidatura para o MIT. Foi um tiro no escuro, ela relembra.

“Não fui muito diligente e fiz o SAT sem me preparar muito; as essays – ensaios obrigatórios que compõem as applications – fiz em cima da hora, quando recebi a notícia de que não tinha entrado no ITA”, confessa.

Ela foi aceita na Poli, mas, mesmo assim, começou um cursinho para entrar no ITA no ano seguinte. Até que veio o dia 14 de março de 2009 e, com ele, a aprovação no MIT. “Acredito que até saber menos sobre o processo foi bom, porque fez com que tudo fosse honesto e de coração aberto. Não tentei me encaixar em nenhum modelo porque não tinha ideia de qual seria este modelo”. Suas extracurriculares foram todas relacionadas ao seu interesse genuíno pela ciência: cursos de física avançada e energia nuclear, e as Olimpíadas Científicas.

Não tentei me encaixar em nenhum modelo porque não tinha ideia de qual seria este modelo

Aprovação e Preparação

Clarrisa se lembra que estava doente, em casa, quando recebeu o e-mail. “Falei baixinho pra minha irmã ‘fui aceita no MIT’. Foi ela quem começou a gritar”, ri. Entre março e setembro daquele ano, ela se deu um gap semester, durante o qual ela reviu algumas das matérias e foi estudar temas como filosofia. “Foi um choque de realidade muito grande, porque não tinha ninguém para conversar sobre o que seria o meu futuro”, relembra.

Em setembro, então com 17 anos, Clarissa mudou-se sozinha de país e de universo. “A quantidade de gente fazendo coisas legais é inacreditável, e por isso o MIT tem uma energia tão boa. Mas, ao mesmo tempo, estar em um local em que todos estão sempre trabalhando em algo, resolvendo problemas, pode ser bem estressante”, desabafa. “Tanto que mesmo agora, no PhD em Princeton, não está sendo tão intenso quanto foi a graduação”.

Duas das maiores dificuldades que ela passou, no início, foram entender as diferenças de expectativas, tanto dos professores quanto da comunidade sobre você; e conseguir escolher com total liberdade suas disciplinas. “É muito mais difícil entender o que você quer, porque, obviamente, se fosse tentar as 50 milhões de coisas que queria, nada sairia perfeito. O difícil é falar não”. A única barreira para qualquer desejo, afirma ela, era mandar um e-mail. “Ninguém vai correr atrás de você, te buscar. Mas você consegue qualquer coisa se tiver a iniciativa”, defende.

“As pessoas são muito motivadas, e pelas melhores razões”, observa. “Não é por aparência, todas querem realmente fazer coisas legais, e o MIT te dá todas as oportunidades para isso”.

 

Candidatura à Graduação x Candidatura ao PhD

Ao concluir a graduação, Clarissa já tinha feito diversas pesquisas sobre qual seria o seu futuro. Ela, que sempre soube que seu destino era a Química – embora, no MIT, tenha estudado biologia e história – tinha consciência de que o próximo passo da sua carreira de pesquisadora seria um doutorado.

Nas escolas de pós-graduação em ciências – Ou Grad Schools – os departamentos e grupos de pesquisa das instituições assumem mais peso do que as próprias universidades. Para Clarissa, Harvard e o próprio MIT seriam ótimos, mas Caltech e Priceton tinham as melhores opções na sua área de pesquisa – sobre uma classe de antibióticos produzida dentro de células bacterianas. “Neste cenário, a porta de entrada é ter um professor por cuja pesquisa você se interesse”.

Não há perguntas voltadas a extracurriculares, amigos… O que importa é a sua pesquisa e o seu mérito

A candidatura para a pós-graduação foi completamente diferente da sua candidatura para a graduação. “É como se fosse uma candidatura a emprego, porque, no fim, você é pago para fazer aquela pesquisa”, observa.  Assim, tanto o contato prévio com o professor/pesquisador quanto um Personal Statement sério e focado na pesquisa são fundamentais. “Não há perguntas voltadas a extracurriculares, amigos… O que importa é a sua pesquisa e o seu mérito”, argumenta.

“O Personal Statement explica o seu résumé. Tem um pouco da parte pessoal, mas em geral é um texto técnico, que explica a sua pesquisa. Para Undergrad (graduação), falar da sua história e suas aspirações é uma coisa boa. Para Grad School, especialmente nas exatas, é mais importante destacar porque você seria um bom pesquisador e como sua experiência seria uma boa adição ao grupo”.

 

Clarissa Forneris PhD em PrincetonComo é ser um estudante de PhD em Princeton

Clarissa explica que a trajetória mais comum para quem está no ramo das exatas não é fazer um mestrado e doutorado, e sim ir direto da graduação ao PhD. “Em todos os PhDs de Ciências há uma prova no meio do curso, que te confere um título de mestrado – chamado de Incidental Masters Degree”. Clarissa obteve o seu Masters na metade de 2015, e agora sua rotina de divide entre apoiar professores em suas aulas e atuar no Laboratório.

Cada um dentro do PhD tem o seu próprio projeto, que pode ter colaborações com colegas. “O sentimento é de estar em uma startup, pois estamos montando juntos o laboratório e tentando desenvolver esta nova área do zero”, inspira-se.

Sobre as suas opções de carreira como pesquisadora após a conclusão do doutorado, prevista para 2020, Clarissa aponta duas direções: “Uma é a pesquisa acadêmica básica, que se traduzem em resultados com aplicação no médio prazo. Já eu me vejo trabalhando na indústria – em uma empresa de biotecnologia ou farmacêutica, fazendo coisas cujos resultados sejam vistos mais rapidamente. De repente, no futuro, me interesso por atuar em uma organização sem fins lucrativos voltada ao desenvolvimento de novas drogas, como o Center for Neglected Tropical Diseases, por exemplo…” considera ela.

“Em ciências, tudo leva muito tempo e exige muita expertise. Não é algo que se aprende e se começa a ser produtivo em dois anos… É muito treinamento, é muita falha, é longo prazo. Ainda tenho muito o que aprender aqui”, conclui ela.

 

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Sobre o escritor

Nathalia Bustamante
Nathalia Bustamante
Nathalia Bustamante é jornalista formada pela UFJF. Foi editora do Estudar Fora entre 2016 e 2018 e hoje é coordenadora de Conteúdo Educacional na Fundação Estudar.

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