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Já pensou em estudar poluição? Este brasileiro foi ao Reino Unido para isso

Nathalia Bustamante - 01/03/2017
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Por Priscila Bellini

O carioca Diogo Medeiros optou pelo PhD em Leeds para estudar a fundo questões ligadas à poluição atmosférica. Formado em Engenharia Química no Brasil, ele conta como foi o processo de escolha de um centro britânico e quais as vantagens de desenvolver pesquisas nessa área por lá.

Como foi a sua formação acadêmica antes de Leeds?

Eu entrei na PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro) em Engenharia Química, mas nem passava pela minha cabeça que eu acabaria estudando a química atmosférica. Só que eu acabei conhecendo o professor André Pimentel, e ele estudava, na época, química atmosférica computacional — ele fazia simulações nos computadores sobre como um poluente iria se degradar na atmosfera. Ele me convidou para fazer um projeto de iniciação científica com ele e eu aceitei. Essa foi a melhor escolha que eu fiz porque foi a partir daí que conheci a química atmosférica, que era uma área totalmente nova para mim, e me apaixonei por aquilo. Com esse projeto, nós conseguimos ganhar o prêmio de iniciação científica pelos alunos de graduação na PUC, em 2010. E o projeto premiado rendeu, inclusive, o meu primeiro artigo, publicado em uma revista dos Estados Unidos, que se chama The Journal of Physical Chemistry A. Graças a esse artigo, o meu professor entrou em contato com o Centro Nacional de Pesquisas Atmosféricas nos Estados Unidos, no Colorado, dizendo que ele tinha um aluno com um projeto premiado e que esse estudante tinha interesse em ir para lá. E eu entrei em contato com esse senhor do centro de pesquisa nos Estados Unidos, o Jeffrey T. Kiehl, que é britânico, e me inscrevi para um programa de pesquisador visitante lá, onde fui aprovado. Depois disso, fiquei três meses no centro de pesquisa, e essa foi a experiência que mudou a minha vida. Até então, eu só tinha estudado a atmosfera no computador.

Então, a experiência nos EUA foi boa…

Foi maravilhosa. Primeiro que, no Brasil, eu não pensava na minha vida “se internacionalizando”. Então, eu fui para o centro de pesquisa com receio de saber pouco, de acabar decepcionando quem eu fosse encontrar por lá, porque eu fui para um centro “top”, referência no assunto. Enquanto eu estava lá, na hora do café, ou do almoço, eu ia comer com aqueles professores bem mais velhos que eu, que eram pesquisadores famosos, e via como eles faziam até piada sobre atmosfera. E eu ficava pensando “eu quero ser um desses caras aí, que ficam fazendo piada sobre tudo isso, que fazem do estudo atmosférico aquilo que eles respiram”.

Depois de formado e de passar por esse centro nos Estados Unidos, por que você escolheu Leeds?

Aqui se faz um conjunto de coisas tão diferentes, todas relacionadas à química atmosférica, que é difícil acreditar que outro grupo consiga fazer a mesma coisa

Foi uma coisa interessante. Para fazer o doutorado em uma dessas universidades em países de primeiro mundo, você precisa de uma carta de recomendação. E eu já tinha na cabeça o Jeffrey T. Kiehl, que me orientou nos Estados Unidos, porque eu sabia que ele tinha gostado do meu trabalho por lá. Eu entrei em contato com ele e pedi recomendações sobre onde fazer um bom doutorado em química atmosférica e ele mencionou Leeds e mais algumas sugestões. Mas, quando eu conversei com o meu orientador do Brasil, o professor André Pimentel, com quem eu fiz o artigo na PUC, a resposta dele foi imediata: “Leeds”.

Eu entrei na página de química atmosférica de Leeds e vi os professores. Eu li a linha de pesquisa do meu orientador, vi que ele trabalhava com câmaras de simulação da atmosfera, que era o que eu tinha feito lá no Colorado, e de que eu tinha gostado muito. Ele é o autor do livro que muitos professores usam no Brasil para dar aula de química atmosférica e, logo que eu vi a carinha dele na foto, achei simpático. Pensei “esse cara aqui vai ser meu orientador”. Eu mandei um e-mail e logo o Paul [Seakins] me respondeu com um texto gigante, com todas as pesquisas que ele estava fazendo naquele momento, com o resumo de cada coisa. Parecia um menu, para escolher o que eu queria comer. Aí, eu pensei: “é esse cara que eu quero, é essa universidade que eu quero”.

O que faz de Leeds uma opção tão boa na área?

Eu realmente acho difícil que exista um centro de química atmosférica no mundo como o da Universidade de Leeds. Existem grupos que fazem coisas muito boas em áreas específicas da química atmosférica, mas aqui se faz um conjunto de coisas tão diferentes, todas relacionadas à química atmosférica, que é difícil acreditar que outro grupo consiga fazer a mesma coisa.

Como é a sua autonomia como pesquisador em Leeds?

Eu tenho a minha própria pesquisa, porque já tinha na cabeça que queria estudar poluição atmosférica, ou algo relacionado. Quando entrei em contato com o Paul, ele disse que esse era um dos projetos que ele estava estudando e eu corri atrás de entender. No meu caso, eu tenho estudado isopreno, que é uma molécula liberada por árvores e plantas na atmosfera em enorme quantidade. Começando do começo: na atmosfera, a gente tem um radical livre que é o radical hidroxila, uma molécula que funciona como detergente. É ele que começa o processo de remoção de poluentes que são lançados na atmosfera. O poluente é liberado na atmosfera, em forma gasosa, reage com esse OH, e a partir daí começa o processo de transformação, até que essa combinação se transforme em um produto final. Em resumo, esse radical é bastante importante. Como o isopreno está em grande quantidade na atmosfera, ele acaba consumindo muito desse radical e “falta detergente” para os poluentes lançados na atmosfera. O isopreno, apesar de vir de plantas e árvores, é uma molécula que também precisa ser degradada. Algumas pessoas se referem a ele como “poluição natural”, que não é o melhor termo para usar. Só que ele acaba, no fim das contas, influenciando na degradação de poluentes lançados na atmosfera, de certa forma.

Então, seria difícil estudar poluição no Brasil?

No Brasil, é difícil fazer qualquer tipo de pesquisa na linha do que eu faço aqui na Inglaterra, por exemplo, por causa do custo. É muito difícil conseguir o financiamento para esse tipo de estudo no Brasil, porque é uma pesquisa cara. A gente gasta muitos cilindros de gases, de oxigênio, de nitrogênio, precisa de muito material que sai muito caro.

Como você compara o ambiente acadêmico brasileiro e o britânico?

Pelo contato que eu tive na minha iniciação científica, eu acredito que em termos de liberdade é bem parecido. O que limita mesmo são os recursos disponíveis. Existem muitos orientadores bons em termos de conhecimento, e que se preocupam com o bem-estar do aluno. O que mais limita é o recurso, e isso tem a ver com a área que se vai estudar. A pesquisa em química atmosférica é cara e as agências vão torcer muito o nariz para liberar uma verba que seja a adequada para que se faça uma pesquisa de qualidade. Aqui no Reino Unido, por outro lado, esses assuntos estão tão estabelecidos, há tanto tempo, que eles já desenvolveram muito as coisas que fazem, já melhoraram muito. Então, para uma pessoa começar do zero, no Brasil, vai ser bem difícil. Vai precisar de uma verba para coisas que ela dificilmente vai conseguir das agências financiadoras. E é aí que a coisa complica, porque isso limita muito a pesquisa.

 

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Sobre o escritor

Nathalia Bustamante
Nathalia Bustamante
Nathalia Bustamante é jornalista formada pela UFJF. Foi editora do Estudar Fora entre 2016 e 2018 e hoje é coordenadora de Conteúdo Educacional na Fundação Estudar.

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