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Revista inglesa THE afirma que ataques do Governo Brasileiro às ciências e educação estão “chegando ao limite”

Mariane Roccelo - 17/01/2022
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A revista inglesa especializada em educação superior Times Higher Education, responsável por manter o famoso ranking de melhores universidades do mundo, publicou um artigo afirmando que os “ataques à ciência” feitos pelo atual presidente brasileiro Jair Bolsonaro estão “chegando ao limite”.

A publicação “Uma derrota de Bolsonaro não reverterá totalmente seu dano à ciência brasileira” (A Bolsonaro defeat will not fully undo his damage to Brazilian science) destaca uma série de “propostas draconianas” implantadas no sistema de ensino e pesquisa brasileiro nos últimos anos.

Entre essas medidas adotadas, o texto chama atenção para o Projeto de Lei do Congresso Nacional (PLN) nº 16/2021, aprovado em outubro de 2021, “que reduz o orçamento federal da ciência em cerca de 90%, desviando 600 milhões de reais do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação para outras agências governamentais”.

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Campanhas anticientíficas

De acordo com a publicação, ambos Trump e Bolsonaro estão “unidos por sua retórica anticiências e de ataques à comunidade científica”. Esse comportamento estaria presente em uma série de de medidas e falas adotadas por ambos. Entre elas, a negação das mudanças climáticas e cortes da regulamentação e fiscalização ambiental e as alegações de que a COVID-19 seria uma farsa, até a promoção de campanhas antivacina e defesa do uso de medicamentos comprovadamente ineficazes.

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Segundo o artigo, essas semelhanças deixam claro que o “manual anticientífico parece bem manuseado”. Além disso, as campanhas antivacinas, popularmente chamadas de antivax, e as tentativas de obstruir a distribuição dos imunizantes causaram resultados “trágicos, refletidos nas acusações criminais decorrentes da morte de centenas de milhares”.

Paralelamente, o texto afirma que, no caso de Bolsonaro, o brasileiro “enfrenta muito menos resistência” ao implantar medidas que atacam as universidades e comunidade científica, quando comparado com Trump.

Cortes de verbas como ferramenta de ataque

O artigo também destacou uma série de importantes cortes de investimento implantados por Trump durante a gestão. Entre os alvos dos ataques, estiveram as agências científicas federais, incluindo a National Science Foundation e o National Institutes of Health, além de cortes de verbas maiores nos Centros de Controle e Prevenção de Doenças, em campanhas que lutam contra a epidemia de Ebola, o vírus Zika e o vício em opióides.

No Brasil, além dos cortes de orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação de 2021, agências de fomento à pesquisa. Em 2019, a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) sofreu um corte de 5.200 bolsas e mais 572 no ano seguinte. Já a CNPq (Conselho Nacional de Pesquisas) enfrenta periódicas dificuldades para pagar seus mais de 84.000 bolsistas desde 2019.

Exoneração do físico Ricardo Galvão

O texto da Times Higher Education afirma ainda que “desde 2019, Bolsonaro busca interromper pesquisas relacionadas às mudanças climáticas e ao meio ambiente brasileiro, acusando o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) de ‘mentir’ sobre dados de satélite que mostram o aumento do desmatamento na Amazônia e demitir seu diretor, o físico Ricardo Galvão”.

Galvão, formado do MIT, foi exonerado do cargo de diretor do Inpe em agosto de 2019, após ser atacado por Bolsonaro por apresentar dados alarmantes sobre o desmatamento no Brasil. Na época, o diretor do Laboratório de Ciências Biosféricas no Centro de Voos Espaciais da Nasa e professor-adjunto da Universidade de Marylanda, Douglas Morton, considerou a demissão como “significativamente alarmante” por refletir “como o atual governo brasileiro encara a ciência”.

Brasil segue exemplo dos EUA

A publicação traça uma série de semelhanças entre o governo do ex-presidente norte-americano, Donald Trump, e Bolsonaro, que seguem “propostas draconianas de cortar o financiamento para pesquisa” e promover “a censura de cientistas através das folhas de pagamento do governo”.

Entre as proximidades destacadas, estão as frequentes ameaças de Bolsonaro de não respeitar as eleições presidenciais, caso os resultados não sejam favoráveis a ele. O comportamento é apontado como “eco do discurso de Trump em Washington antes da tomada do Capitólio em 6 de janeiro (de 2021)”. Na ocasião, partidários do ex-presidente estadunidense invadiram a sede do legislativo do Estados Unidos durante a ratificação da vitória do atual presidente John Biden. O ataque deixou 4 mortos e mais de 800 feridos.

Sinais de enfraquecimento

Acompanhando a derrota presidencial de Trump para Biden em 2020, pesquisas brasileiras recentes indicam que, por aqui, Bolsonaro tem grandes chances de perder as próximas eleições, que acontecerão em outubro deste ano. Caso não seja reeleito, os cientistas brasileiros “sem dúvida, darão um grande suspiro de alívio”, afirma a publicação.

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Entretanto, o texto destaca que as medidas adotadas por Bolsonaro nos últimos anos podem causar danos que tendem a permanecer vivos após a saída do presidente brasileiro. “O que é evidente é que o rebaixamento da ciência e da erudição – através da promulgação da ideia de que os fatos são uma questão de debate – se alinha com um declínio vertiginoso na confiança nas instituições públicas e na própria democracia”. Essa relação de fatores terão “um impacto deletério de longo prazo no Brasil, nos EUA e em outros lugares”.

Sobre a publicação

O artigo foi escrito pelo pesquisador e professor de Políticas Públicas e Ensino Superior no Public Policy and Higher Education, do Centro de Estudos sobre Educação Superior (CSHE), da Universidade da Califórnia – Berkeley, John Aubrey Douglass. A Times Higher Education é uma revista inglesa criada em 1971 e considerada uma das principais referências internacionais sobre educação superior.

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Sobre o escritor

Mariane Roccelo
Mariane Roccelo
Jornalista. Formada em Jornalismo e Comunicação Social pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP). Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Meios e Processos Audiovisuais (PPGMPA) e doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação (PPGCOM), ambos da USP.

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