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“Não é preciso ter uma trajetória linear”, diz bolsista de doutorado na Bélgica

Colunista do Estudar Fora - 19/07/2017
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Olá! Meu nome é Oscar, tenho 27 anos e sou aluno do quarto (e último) ano de doutorado pleno em Engenharia Elétrica em Leuven, na Bélgica. Depois de acompanhar o excelente trabalho da Fundação Estudar por alguns anos resolvi me envolver e começar a contribuir como colunista do Estudar Fora. Para essa primeira coluna, achei melhor começar pelo começo – contando um pouco da minha trajetória e como cheguei até o doutorado fora, fazendo o que faço hoje.

Ao contrário da maioria das pessoas que optam por um doutorado, minha trajetória não foi exatamente linear. Inicialmente eu não tinha muita certeza de o que queria cursar, mas estava disposto a experimentar, acreditando que de uma forma ou de outra aquilo que eu aprendesse seria útil.

Idas e Voltas na Graduação para descobrir o que queria

No primeiro ano de faculdade, em 2007, cursei Física e Economia, além de ter estagiado em banco e feito um curso técnico em Automação Industrial. Esse curso me levou pra Itália pela primeira vez, para um estágio de 2 meses – uma experiência que me mostrou que eu gostava mesmo era de construir coisas que não existiam ainda, ao invés de somente analisar e/ou modelar sistemas como era feito na Física ou na Economia.

Em 2008, então, resolvi cursar Engenharia Elétrica, engatando logo de cara em estágios e iniciação científica. Nesta mesma época, fiz uma Summer School em microeletrônica, com professores da Alemanha, que abriram minha cabeça para o que eu realmente queria seguir como carreira.

Em 2010 voltei pra Itália para cursar dois semestres como aluno de intercâmbio, contando com uma bolsa de uma fundação italiana. Mais uma vez busquei um estágio no laboratório da universidade para complementar o que eu aprendia em sala de aula – e este estágio acabou sendo tema do meu trabalho de conclusão e gerando uma publicação nacional.

Nos últimos três semestres de graduação, já de volta ao Brasil, continuei estudando por conta os temas que me interessavam e complementando essa experiência trabalhando como projetista de circuitos eletrônicos (44h/semana, CLT) em uma empresa local. Meus dias começavam as 6h30 e acabavam lá pela 1h da manhã – incluindo sábados – mas o crescimento que conquistava era visível.

Um mestrado fora… que não deu certo

Este período na indústria foi uma boa experiência, mas eu já sabia que gostaria de desenvolver tecnologias mais avançadas – coisas que tinha visto brevemente na Itália, mas que não existiam ainda no Brasil. Por isso, logo que terminei a graduação, me inscrevi em um mestrado internacional em nanotecnologia na Europa, mas minha candidatura foi recusada.

Sem desistir, resolvi me esforçar mais ainda para no futuro tentar novamente. Comecei o mestrado em Engenharia de Controle e Automação da UFSC, mas logo em seguida voltei pra UFRGS para fazer uma especialização em projeto de circuitos integrados. Essa foi a chave que me abriu as portas da micro e nano-eletrônica – meu sonho desde 2009, mas que contava com muito poucas iniciativas no Brasil.

Terminando essa especialização fui convidado para entrar direto no doutorado da UFRGS, que tem um dos melhores programas da área no Brasil. Eu tinha casa e amigos em Porto Alegre, além de morar perto da família, o que teria sido o caminho mais fácil. Porém, eu teria que abrir mão do sonho de fazer o doutorado fora.

Optei por fazer um acordo com meu orientador: eu entraria e defenderia o mestrado em um ano, ao invés de dois, e avaliaríamos a situação depois disso. Meu objetivo era fazer um bom trabalho para conseguir uma bolsa de doutorado fora do Brasil. Um ano de muito trabalho e dedicação rendeu bons frutos, com várias publicações e viagens internacionais, e um prêmio de melhor dissertação de mestrado pela Sociedade Brasileira de Microeletrônica (SBMICRO).

A essa altura eu sabia que estava pronto para começar um doutorado fora, e por recomendação dos meus orientadores, me candidatei aos melhores grupos de pesquisa dos EUA e da Europa. Acabei vindo para Leuven, na Bélgica, em outubro de 2014.

Mas por que Bélgica? 

Eu me candidatei para grupos de pesquisa que me interessavam, sem estar muito preocupado com o país. A Universidade de Leuven foi a primeira a mandar a aceitação – com bolsa integral! Eu sabia que poderia recusar a oferta e aguardar a resposta das universidades americanas, sabendo que tinha boas chances lá também, mas alguns fatores que pesaram na minha decisão:

  1. A Bélgica tem um dos melhores financiamentos para doutorado da Europa, com uma bolsa média de 2 mil euros/mês e uma duração fixa de 4 anos. Isso é melhor que o salário médio de um engenheiro recém-formado, e a verba para a pesquisa é bem generosa. Calculando por cima meu doutorado fora vai custar em torno de 300 mil euros para o instituto que me recebeu.
  2. Além disso, eu tenho dupla nacionalidade (Italiana) e posso morar e trabalhar na Europa sem necessidade de visto.
  3. Durante a entrevista eu tive a chance de conhecer meu futuro orientador, e senti que tínhamos uma boa compatibilidade, fator importantíssimo para trabalhar junto todos os dias por 4 anos.
  4. Não vou dizer que foi a cerveja e o chocolate belga para não me complicar.

Aceitei e, desde então, tenho trabalhado em um instituto de pesquisa chamado IMEC, que é um dos líderes mundiais em pesquisa e desenvolvimento avançado em nano-eletrônica e tecnologias digitais. São 3.500 pessoas e mais de 100 nacionalidades, com um faturamento de mais de 500 milhões de euros por ano.

E o que, exatamente, faço no meu doutorado fora?

A pesquisa envolve desde a parte mais física de processo de fabricação de semicondutores e painéis solares até aplicações de alto nível como inteligência artificial, sequenciamento de DNA e implantes cerebrais. O meu grupo trabalha especificamente com comunicação sem fio para a nova geração de telefonia (ou 5G) e com radares de alta resolução. Meu projeto é desenvolvido aqui 95% do tempo, sendo que eu sou também aluno da Universidade Livre de Bruxelas (VUB), que é a instituição que emite o diploma de doutorado, e onde eu passo os 5% restantes dando aula para o mestrado em Engenharia Eletrônica da universidade.

Resumindo, acho que experimentação, dedicação e vontade de aprender na pratica foram três fatores chave para descobrir o que realmente me interessava. Depois de encontrada uma área, o jeito foi estudar e trabalhar muito sem nunca desistir do sonho, apesar dos desafios e de alguns insucessos. Acho que tive sorte quando a preparação encontrou a oportunidade.

Nas próximas colunas vou tentar falar mais sobre essas características em comum que se aplicam não só ao meu caso, mas ao de muitas outras pessoas que eu conheci ao longo desses anos.

Também contar sobre como é morar aqui, como funciona o processo de admissão para a graduação e para pós-graduação, e assim por diante.

 

Sobre o Autor

Oscar Mattia

Oscar mora na Bélgica desde 2014, depois de duas passagens pela Itália e por quatro cidades do sul do Brasil. Engenheiro eletricista por formação, hoje faz doutorado no imec, um dos maiores centros de pesquisa em nano-eletrônica e tecnologias digitais da Europa. Como colunista do Estudar Fora conta sobre essas e outras experiências, buscando contribuir com brasileiros que tem o sonho de estudar no exterior.

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Sobre o escritor

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Os colunistas são estudantes e especialistas convidados pelo Estudar Fora para compartilhar sua experiência. É neste espaço que você verá relatos em primeira pessoa dos estudantes ou orientação especializada de profissionais que atuam com estudos no exterior.

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