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Entenda como funciona a iniciação científica no exterior

Nathalia Bustamante - 24/02/2016
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Por Nathalia Bustamante

Desde o início do século XX, o inglês se tornou a língua franca da pesquisa científica: 80% dos artigos publicados internacionalmente são neste idioma. Mesmo países não-anglófonos, como Alemanha e Holanda, têm parte relevante das suas publicações nacionais feita em inglês, de forma que sejam acessadas de forma mais fácil.

A experiência é muito bem vista porque implica que, além de saber lidar com reuniões, relatórios e seminários em inglês, também consigo administrar com mais tranquilidade e independência os cronogramas e adversidades que surgem no decorrer do experimento

Não à toa, se discute muito no Brasil a necessidade de superar a barreira da língua para que o país se posicione melhor como produtor de conhecimento entre outras nações em desenvolvimento. Este processo é facilitado se os pesquisadores tiverem domínio da língua e, mais ainda, se tiverem a oportunidade de conduzir seus experimentos em um ambiente internacional.

No Brasil, bolsas para doutorado e pós-doutorado no exterior são mais comuns, mas é possível começar desde cedo: já na graduação há financiamento para quem deseja conduzir pesquisas fora do país. Em geral, há dois tipos de pesquisa científica na graduação: a extracurricular – que pode, por sua vez, ser durante o período letivo ou durante as férias – ou a curricular, que aparece como uma disciplina no histórico acadêmico.

Este último é o caso de Danielle Nascimento que, desde o terceiro período da faculdade, conduzia experimentos em genética mitocondrial no Instituto de Química da USP.  Esta iniciação científica, feita no Brasil, abriu para Danielle a possibilidade de realizar um semestre de pesquisa no exterior. Seu orientador tinha cooperação com a Universidade de Aarhus, na Dinamarca, para onde ela foi em 2013 por meio do programa de Bolsa Mérito da USP.

Na USP, o processo de seleção para a bolsa envolve a apresentação de um projeto de pesquisa, de carta de aceite da universidade de estrangeira e carta de recomendação do orientador. Também é necessário comprovar proficiência na língua da universidade de destino. Diversas outras universidades do Brasil oferecem este tipo de mobilidade internacional, embora os pré-requisitos e universidades parceiras variem em cada caso.

Aprovada, Danielle matriculou-se em uma disciplina do mestrado da Universidade de Aarhus e cumpria seus créditos no laboratório de genética da universidade. “Eu tinha meu próprio projeto e era orientada simultaneamente pelos professores de lá e de cá”, comenta ela. A cada quinze dias, ela se reunia com os orientadores para sanar dúvidas e discutir resultados. Já a equipe do laboratório tinha encontros semanais para trocar referências e sugestões, no formato de apresentação de seminários. Ao final do período, professores apontados pela Universidade de Aarhus avaliaram seus relatórios.

De volta ao Brasil, Danielle foi aprovada para o mestrado do Instituto A.C. Camargo, onde atualmente conduz pesquisas em mutações genéticas. Para ela, a experiência de ter atuado em um laboratório no exterior foi importante para que desenvolvesse resiliência e organização. “A experiência é muito bem vista porque implica que, além de saber lidar com reuniões, relatórios e seminários em inglês, também consigo administrar com mais tranquilidade e independência os cronogramas e adversidades que surgem no decorrer do experimento. Tudo isso é bem importante para o desenvolvimento profissional, na área acadêmica ou não”, avalia.

Da Universidade Yale para o CERN

Todos os alunos de Yale têm acesso à pesquisa em qualquer área, basta que você esteja interessado. Em geral, os professores são muito abertos e esperam que os alunos entrem em contato

Estudante de física na Universidade de Yale, nos Estados Unidos, Bárbara Cruvinel Santiago faz pesquisa desde o primeiro semestre. Segundo ela, o processo para ser aceito para um grupo de pesquisa não é nada burocrático: o contato é feito diretamente com o professor da pesquisa de interesse. “Todos os alunos de Yale têm acesso à pesquisa em qualquer área, basta que você esteja interessado. Em geral, os professores são muito abertos e esperam que os alunos entrem em contato”, comenta ela.

Foi assim que, em 2014, ela conseguiu uma bolsa para fazer experimentos no CERN – o maior laboratório de física de partículas do mundo, localizado em Genebra, na Suíça. “No caso do projeto do CERN, havia um processo de inscrição mais formal porque eram três professores que levavam equipes. Eu não consegui submeter meus documentos a tempo, mas enviei diretamente para uma das professoras e ela me aceitou”, conta ela. Bárbara ressalta, porém, que a seleção para uma fellowship – as bolsas oferecidas pela universidade – é mais concorrida e geralmente mais complicada.

Bárbara passou dois meses das suas férias de verão no CERN. Segundo ela, o ambiente do laboratório era quase universitário: “Tinha gente de todos os lugares do mundo, e nós nos reuníamos bastante para conversar e trocar experiências”, comenta.

Além de palestras e seminários sobre física, ela tinha reuniões semanais com seus colegas e orientadores, nas quais o progresso de cada um era discutido. Já o contato com o acelerador de partículas, em si, era mínimo: “É um detector gigante que funciona pela colaboração de 11 mil pessoas, então, no fim das contas não tem como ir lá e tocar um experimento. Por isso, a pesquisa experimental em física de partículas é praticamente programação. Nós mexemos no código, fazemos simulações nos dados até encontrar algo relevante”, explica.

Ao retornar, Bárbara optou por não continuar a pesquisa com física de partículas. “Trabalhar com pesquisa desde muito cedo foi bom pois fui exposta a diferentes área da física, para identificar o que eu realmente queria fazer”, observa ela, que atualmente estuda física atômica.

Embora ainda incerta sobre o que vai fazer quando se formar, Bárbara tem vontade de continuar os estudos nos Estados Unidos cursando um PhD. Para ela, estar desde cedo no laboratório foi importante não apenas para o currículo, mas também pelos conhecimentos adquiridos. “Quando se aplica para PhD, é esperado que se tenha um histórico em laboratório, que tenha experiência em programação, eletrônicos… Coisas que eu não aprenderia apenas na sala de aula”, finaliza.

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Sobre o escritor

Nathalia Bustamante
Nathalia Bustamante
Nathalia Bustamante é jornalista formada pela UFJF. Foi editora do Estudar Fora entre 2016 e 2018 e hoje é coordenadora de Conteúdo Educacional na Fundação Estudar.

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