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Quais são os valores (reais) de um intercâmbio

Lecticia Maggi - 10/06/2016
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Por Gerson Saldanha

Já nos meus primeiros dias na faculdade, escutava muito o pessoal dos períodos posteriores planejarem fazer um intercâmbio durante as férias de julho ou de dezembro. Pensava como aquela galera falava em estudar dois ou três meses no centro de Londres com tanta facilidade – afinal, fazer um intercâmbio, para mim, além de ser surreal, custaria muito caro.

Sou filho de um pedreiro e de uma dona de casa, que puseram meu nome de Gerson, sem saber que em hebraico esse nome significa peregrino ou viajante. Involuntariamente, sempre tive esse espírito aventureiro mesmo: saí da minha casa, no Rio de Janeiro, com 18 anos recém-completos e fui morar em uma escola de formação da Marinha, em Vila Velha, Espírito Santo, bem longe de qualquer amigo ou parente.

Depois de várias tentativas, consegui passar no vestibular e, em 2013, ingressei no curso de Relações Internacionais – graduação esta que já à primeira vista exige no mínimo fluência em um idioma e experiência internacional. Estudei bastante inglês durante minha adolescência, por causa de fundações e ONG’s que davam aulas e até mesmo bolsas de estudo para alunos da rede pública, e eu aproveitei bem estas oportunidades. Mas um intercâmbio… ainda não dava para fazer, de jeito nenhum.

Neste mesmo ano de 2013, fui transferido para a Escola Naval, onde trabalhei como barbeiro para bancar meus estudos. Um dia, achei um recorte de jornal relatando que o periódico daria um intercâmbio para quem melhor respondesse à pergunta: “o que você levaria na bagagem, caso vencesse a promoção”. Respondi e ganhei, e para a situação ser mais especial ainda, o dia do embarque era o dia do meu aniversário.

Lá fui eu para a minha primeira experiência fora: Passaria três semanas em Seattle, Estados Unidos, estudando inglês na Evergreen State College, onde nomes como Kurt Cobain, do Nirvana, Matt Groening, criador dos Simpsons e o rapper Macklemore já estudaram um dia.

eu poderia não ter acreditado na promoção do jornal quando eu vi, ou achar que muita gente boa iria escrever e provavelmente eu perderia

O primeiro valor real que eu aprendi com esse fato surreal na minha vida foi que sim, coisas impossíveis talvez sejam possíveis. Vai muito do ponto de vista. Por exemplo, eu poderia não ter acreditado na promoção do jornal quando eu vi, ou achar que muita gente boa iria escrever e provavelmente eu perderia, ou seja, era impossível me tornar o vencedor do concurso que mudou a minha vida. Mas tive fé e, na realidade, não levei muito em conta a concorrência – apenas dei o meu melhor no momento que estava escrevendo a redação.

Existem muitos editais com bolsas de estudo por aí (o Estudar Fora mesmo publica vários) e tem muita gente que não se inscreve quando são aplicáveis porque acham ser impossível vencer a concorrência. Se você tiver fé, der o seu melhor e fazer de coração, com certeza, as coisas acontecem.

Uma qualidade que se tornou um valor fundamental na minha vida é a paciência. Confesso que não sou um muito paciente, mas exercitei a bendita em várias fases: primeiro, em épocas quando eu queria fazer intercâmbio e não sabia como procurar pelas oportunidades; depois, quando não sabia como funcionava para tirar a documentação para viajar para o exterior. Foram processos e mais processos para tirar visto e passaporte para que eu conseguisse tudo em tempo hábil. Tive que arrumar cartas de recomendações, documentos que comprovassem que eu iria estudar e ainda uma autorização para que eu pudesse viajar sem estar em missão no quartel, visto que ainda era militar na época. Mas, no final, tudo deu certo.

Conheci muita gente nas viagens e muitos brasileiros que chegaram ao exterior de “n” formas diferentes, e não achava justo guardar estas informações somente para mim

Por fim, não deixar as recordações somente nas fotos do facebook foi mais um valor que eu trouxe lá de fora. Isso porque aprendi muita coisa no estrangeiro (depois de Seattle, fiz mais dois intercâmbios, um para Londres e outro para Nova York) – desde recolher lixo dos lugares públicos, mesmo que não seja meu, até passar adiante todas as informações que recebi. Conheci muita gente nas viagens e muitos brasileiros que chegaram ao exterior de “n” formas diferentes, e não achava justo guardar estas informações somente para mim. Quando voltei para o Rio, criei o projeto “O Que Eu Trouxe Na Bagagem”, que visa conscientizar estudantes de escolas públicas acerca de possibilidades de intercâmbio e bolsas de estudo no exterior. E agora, no segundo semestre deste ano, quero percorrer todas as capitais do Brasil para falar para a galera de escolas públicas, particulares, vestibulandos, universitários e quem mais quiser, que fazer intercâmbio é uma experiência tão rica, de valor inestimável que não tem dinheiro que pague.

 

 


 

Sobre o autor:

GersonGerson Saldanha é estudante de Relações Internacionais pela Universidade Estácio de Sá (RJ). É viciado em música, tanto que estuda canto, vai fazer uma monografia sobre hip-hop e estudou italiano por amor ao canto lírico. Escreveu dois e-books “O Que Eu Trouxe Na Bagagem”, que ultrapassou os 50 mil downloads e “Lá Fora – 9 semanas longe de casa”, disponível na Amazon. Planeja uma turnê nacional em 2016 para disseminar a cultura do intercâmbio no Brasil.

 

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Sobre o escritor

Lecticia Maggi
Lecticia Maggi
Jornalista formada pela Faculdade Cásper Líbero e pós-graduada em Gestão de Negócios pelo Senac-SP. Foi editora do Estudar Fora entre 2014 e 2016. Atualmente, é coordenadora de comunicação no Iede (Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional), que tem como um de seus objetivos ajudar a qualificar o debate educacional no país.

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