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‘Cresci na periferia de São Paulo e fui aprovado em Harvard, Stanford e MIT’

Lecticia Maggi - 16/06/2015
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Em 2010, ouvi pela primeira vez a história de alguém aprovado em uma faculdade americana. Era a do Marco Antônio, que tinha acabado de ser aceito no MIT (Massachusetts Institute of Technology). Aquilo era surreal para mim, achei o cara incrível e pensei “Caraca… Ainda vou chegar lá!”

Depois de ler um pouco sobre os perfis que as faculdades americanas procuravam, concluí: ‘Não vou montar o perfil que acho que elas procuram. Vou montar o meu perfil, extrair o máximo de quem sou’

Lembro que fiquei impressionado com o número de medalhas que o Marco tinha em olimpíadas científicas. Estando no 8º ano, eu me empolguei e comecei a fazer algumas dessas olimpíadas também, certo de que elas eram necessárias para seguir uma trajetória parecida com a dele. Fazer as provas era divertido, eu gostava dos números e do desafio. Cheguei a ganhar medalhas no 9º ano, mas tudo parecia distante das dezenas que o Marco e outros aprovados em faculdades americanas tinham e comecei a pensar que eu não era feito para aquilo. Perdi um pouco da motivação para estudar para as olimpíadas e comecei a querer explorar outras áreas.

Depois de ler um pouco sobre os perfis que as faculdades americanas procuravam, concluí: “Não vou montar o perfil que acho que elas procuram. Vou montar o meu perfil, extrair o máximo de quem sou. Se as faculdades me rejeitarem por falta de medalhas de matemática e física, tudo bem, significa que lá não é meu lugar. Caso isso aconteça, pelo menos vou ter me dedicado a coisas em que acredito.”

Depois de decidir isso, tinha que descobrir algo a que eu queria me dedicar. Meus planos começaram a ficar mais claros em 2013. No começo daquele ano, recebi um e-mail falando do Explo, um programa de férias em Yale, que, apesar de ser pago, tinha uma parte reservada para bolsas. Fiquei deslumbrado com a ideia de passar três semanas em uma das melhores faculdades do mundo e fui pesquisar os procedimentos para aplicar para a bolsa. O site informava que, “devido à altíssima concorrência pelas bolsas, mesmo alunos qualificados tinham grandes chances de não conquistá-las”. Pensei: “Quais as chances de eu, do Capão Redondo, periferia de São Paulo, conseguir essa bolsa que pessoas do mundo todo estão procurando?”.

Se eu, do Capão, estou aqui em Yale, a partir de agora qualquer coisa vai ser possível

Depois de questionamentos, conflitos internos e reflexões, repensei e decidi: “Não posso recusar o desafio. Vou tentar e conseguir essa bolsa”. Procurei ajuda, conheci uma professora que me deu enorme apoio e, após alguns meses, recebi a ligação dela informando que tínhamos conquistado a bolsa. Entre todos os aprendizados daquele intercâmbio no meu 2º ano do ensino médio, o maior deles foi me conscientizar sobre meu potencial: “Se eu, do Capão, estou aqui em Yale, a partir de agora qualquer coisa vai ser possível”.

Voltei para o Brasil inspirado para arriscar e persistir. Fundei um projeto social com meu grande amigo, João Araújo, pedi ingressos para ir a eventos de empreendedorismo de graça, corri atrás de oportunidades de estágio, e aprontei outras que, apesar de muitas vezes parecerem sem noção, no final me fizeram crescer e construir habilidades e projetos importantes.

Além de autoconfiança, a viagem para Yale também me trouxe a certeza de que queria estudar nos EUA. Enquanto estava lá, conheci o Paulo, brasileiro que fazia graduação na faculdade. Ele me contou sobre todas as oportunidades incríveis que teve e percebi que as universidades americanas me dariam ferramentas poderosas para gerar todo o impacto que sempre quis.

Lógico que nem tudo foi lindo. Quando fiz meu primeiro SAT fui mal (…) Precisei me manter motivado especialmente durante os 3 últimos meses de 2014, quando dormia entre duas e três horas por noite

Em 2014, consegui o apoio fundamental da Fundação Estudar e do EducationUSA para me orientarem no processo de application (candidatura). Os mentores de ambas as instituições foram incríveis e me deram toda a ajuda de que precisei. Lógico que nem tudo foi lindo. Quando fiz meu primeiro SAT, por exemplo, fui mal. Várias vezes ao longo do ano, comparando meu perfil com o de outros candidatos brasileiros, pensei “Caraca… Eles são muito bons, quais as chances de eu passar?”.

Enfim, nada que não fosse resolvido depois de procurar mentores e amigos para me darem uma energia. Precisei me manter motivado especialmente durante os 3 últimos meses de 2014, quando dormia entre duas e três horas por noite para estudar para o SAT, escrever redações para as faculdades, e ter ideias para que elas fossem criativas e únicas. Tudo isso, lógico, acontecendo ao mesmo tempo do Enem e da Fuvest (vestibular da USP). Foi muito cansativo, mas aprendi muito durante essa fase!

Valeu o esforço. Fomos aprovados em Columbia, Duke, Harvard, MIT e Stanford. Escrevo no plural (“fomos”) porque foi o trabalho de um time. Tive muitas pessoas torcendo e me ajudando muito durante todos esses últimos anos e sem elas eu não teria conseguido essas admissões.

Dentre as universidades em que fui selecionado, optei por Stanford (saiba por que). E esse é só o começo. Temos muito para fazer e acredito que os próximos 4 anos lá vão me preparar para fazer uma diferença gigantesca no Brasil e talvez no mundo. Nessa coluna, vou compartilhar um pouco do que acontece de mais louco num dos maiores centros de inovação do mundo. Espero que gostem!

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Gustavo Torres colunaGustavo Torres cresceu no Capão Redondo, periferia de São Paulo, onde aprendeu cedo que apenas muita dedicação o permitiria transformar sua vida e o mundo. Tal dedicação o levou ao Ismart, instituto que concede bolsa de estudos para alunos da rede pública cursarem o ensino médio nas melhores escolas particulares de SP e RJ. Em gratidão às oportunidades que teve, Gustavo deu aulas na escola pública de onde veio e hoje desenvolve um projeto que ajuda jovens de sua comunidade a descobrirem e concretizarem seus sonhos. Apaixonado por empreendedorismo, tecnologia e inovação, seu “sonho grande” é criar uma empresa de tecnologia que gere benefício social. Em Stanford, espera adquirir os conhecimentos necessários para isso.

*Foto de abertura da coluna: Gustavo Torres durante visita ao MIT/ Crédito: arquivo pessoal

Quer saber mais sobre o Gustavo Torres? Confira: 
Bate-papo: em vídeos, Gustavo conta como foi aprovado em 5 universidades de excelência dos EUA
Do Capão Redondo para o mundo
Conheça o mentor do Gustavo, que o ajudou no processo de application

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Sobre o escritor

Lecticia Maggi
Lecticia Maggi
Jornalista formada pela Faculdade Cásper Líbero e pós-graduada em Gestão de Negócios pelo Senac-SP. Foi editora do Estudar Fora entre 2014 e 2016. Atualmente, é coordenadora de comunicação no Iede (Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional), que tem como um de seus objetivos ajudar a qualificar o debate educacional no país.

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