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Tratar a educação como “bem de consumo” leva a “degradação” do sistema de ensino, afirma ONU

Mariane Roccelo - 11/01/2022
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As sociedades precisam ser “muito, muito cuidadosas” para evitar que a crescente participação de atores não-estatais no sistema de ensino transforme a educação em um “bem de consumo”, afirma Marcos Antoninis, diretor da Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e a Cultura. A fala aconteceu durante o lançamento do último Relatório de Monitoramento Global da Educação (GEM) 2021-22 e foi relatada neste texto (disponível aqui em inglês) do site Times Higher Education.

Segundo ele, a má relação entre a iniciativa privada e governos poderia levar a uma “degradação” do “conceito de educação”. O relatório destaca a importância de entender todos os atores do sistema de ensino, como as instituições envolvidas, alunos e professores, como parte de um sistema único que deve atuar em defesa da educação universal. “Padrões, informações, incentivos e prestação de contas devem ajudar os governos a proteger, respeitar e cumprir o direito à educação de todos”, afirma o relatório.

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Intitulado Who chooses? Who loses? (Quem escolhe? Quem perde?), o documento aborda a relação, muitas vezes conflituosa, entre a defesa da educação universal de qualidade e a transformação do sistema de ensino em um produto comerciável devido à interferência descontrolada da iniciativa privada.

No lançamento, o diretor levantou preocupações sobre como a educação está sendo cada vez mais tratada em termos comercializáveis. “Cada vez mais, sob pressão dos provedores que não são estatais, a educação está sendo empacotada como um bem de consumo e a linguagem que está sendo usada para isso leva as pessoas a pensarem nessa direção”, afirmou.

Equilíbrio entre o setor privado e o público

A partir dos dados obtidos, o diretor destacou que cerca de um terço dos estudantes do mundo estão matriculados em instituições de ensino particulares. Um dos problemas dessa grande participação das iniciativas privadas no setor é que muitos países em desenvolvimento tentam suprir a demanda crescente por formação em nível superior através do estímulo à criação de instituições pagas, o que pode afastar as camadas mais pobres da educação especializada e acentuar uma série de desigualdades.

De acordo com o relatório, “a educação com financiamento público não precisa ser fornecida publicamente, mas a disparidade nos processos educacionais, nos resultados dos alunos e nas condições de trabalho dos professores deve ser abordada” na hora de estruturar o sistema de educação. Os governos devem priorizar a “eficiência e inovação” mais do que “segredos comerciais”, além de manter um processo de política pública de educação transparente e íntegro.

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“Os provedores não estatais tendem a reservar o acesso para aqueles que podem pagar. Em certos contextos, alguns podem tentar aumentar o acesso para aqueles que foram excluídos. Mas, em ambos os casos, existe o risco de segregação no sistema de ensino superior”, afirma o relatório. No lançamento, o diretor destacou que o problema não está relacionado a quem fornece o ensino superior, mas como as políticas de regulamentação do acesso à educação universal são construídas.

“Há cada vez mais um sentimento de que se trata de competir, superar os outros e, portanto, você investe para melhorar suas próprias chances pessoais no mercado de trabalho e na vida”, afirma. Esse movimento pode levar a uma degradação da “compreensão e do conceito de educação”.

Falta de diversidade no sistema de ensino

O relatório também destaca a falta de diversidade e alta segregação no acesso ao sistema de educação superior em países, como Brasil, Argentina, Chile e México. Segundo o documento, ao abrir espaço para a entrada do setor privado no sistema de educação, os governos precisam garantir meios de “proteger os mais desfavorecidos”, evitando abusos contra esses estudantes e garantir a qualidade do ensino em ambos modelos público e privado.

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“No Brasil, as autoridades concorrenciais vêm lutando contra a concentração de mercado”, destaca o relatório. “Nos Estados Unidos, 7 das 10 maiores empresas de educação com fins lucrativos foram consideradas culpadas de práticas comerciais enganosas, incluindo recrutamento predatório e estratégias de marketing”, completa.

No lançamento, o diretor também destacou o importante papel da regulamentação das políticas educacionais como uma das ferramentas mais importantes para equilibrar e garantir a equidade, a qualidade e um bom convívio entre a educação pública e privada de cada país. A íntegra do relatório pode ser encontrada neste link (disponível aqui).

 

 

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Sobre o escritor

Mariane Roccelo
Mariane Roccelo
Jornalista. Formada em Jornalismo e Comunicação Social pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP). Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Meios e Processos Audiovisuais (PPGMPA) e doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação (PPGCOM), ambos da USP.

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