Por Felipe Barreto Távora , estudante do Prep Program 2025
Em um país com um ensino médio pensado para a aprovação em vestibulares como o ENEM e repleto por certames em que a prova é, na grande maioria dos casos, o único ou o grande definidor do ingresso ao ensino superior, optar por um processo holístico e subjetivo como o adotado pelas universidades americanas pode parecer muito arriscado e ambicioso. Aquele que opta por esse caminho pode se sentir sozinho ao ser envolvido por um ambiente onde ele ou ela é exceção.
Nesse sentido, é comum que o desejo de ingressar nas mais prestigiadas universidades americanas tenha sido sucessor do desejo de ingressar em universidades brasileiras, o que é, em tese, o plano dos alunos do ensino médio. Assim, mesmo se apaixonando pelo mundo da aplicação, alguns estudantes não abandonam a possibilidade de fazer a graduação em terras brasileiras. Tentando balancear a preparação para ambos os objetivos, é normal que a seguinte pergunta surja:
“É possível se preparar adequadamente para vestibulares brasileiros e para o processo de aplicação às mais competitivas universidades americanas de forma simultânea?”
Se você é uma das pessoas que está passando por isso, vem comigo que eu vou te mostrar que você não é o único – e ajudar na sua decisão de manter a preparação para os vestibulares brasileiros e para a aplicação às universidades americanas ou focar exclusivamente em um deles!
Matheus Nucci Mascarenhas, natural de Campinas (SP) e atual aluno do curso de Ethics, Politics and Economics na renomada Universidade de Yale, também passou, no mesmo ano de sua aprovação, para a mais renomada faculdade de direito do Brasil: a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, no Largo São Francisco. Além disso, ele se preparou para o processo de admissão às universidades britânicas, muito diferente do americano. Matheus estudou em um colégio onde a preparação para os vestibulares era muito valorizada e, tendo que manter boas notas para o envio de sua aplicação, se preparou também suficientemente para ser aprovado no concorrido vestibular da Fuvest.
Dois dias antes da 2ª fase da Fuvest, Matheus recebeu a notícia da aprovação em Yale e fez o exame “sem nenhuma pressão”. Após a aprovação na FDUSP, Matheus ainda tinha um semestre pela frente antes de ir aos Estados Unidos. Decidiu, assim, cursar o 1º semestre da faculdade, o que, segundo ele, foi uma experiência que valeu muito a pena, refletindo os benefícios de ter se preparado para duas frentes durante o seu terceiro ano.
Matheus Nucci Mascarenhas
“Tive a intenção de aplicar desde o final do meu 2º ano do Ensino Médio e minha escola, Colégio Notre Dame de Campinas, era muito focada em vestibulares. Entrei no 3º ano já tendo decidido aplicar para Yale e me preparar para a FUVEST. Se você estiver no 1º ou 2º ano do Ensino Médio, já tente participar como treineiro de provas, não estude superficialmente e pense em estratégias. Para mim, essa bagagem de antes foi muito importante. Fiz o ENEM desde o 9º ano e a FUVEST desde o 1º ano.
Voltei de viagem em janeiro e montei um plano anual, com as metas mensais a serem batidas. Percebo que é importante você focar nas suas fraquezas, que no meu caso era a desorganização. Pensei então ‘o que eu posso fazer para ser mais organizado?’. Da mesma maneira, ser excessivamente organizado pode gerar uma carga emocional forte e atrapalhar no processo.
Além dos planejamentos mensais, havia os semanais, todo domingo à tarde eu planejava a semana. Nem sempre dava certo, mas eu tinha noção do que eu tinha que fazer, tinha um local onde consultar minhas pendências, e a aplicação é um processo muito fragmentado! Muitas essays e o vestibular é uma maratona, algo longo.
Algo que ajuda consideravelmente é aprender a enfrentar o desconhecido: nem todas as apostilas e questões serão feitas e nem todos os conteúdos, assimilados.
Como não surtei? Tempo de descanso. Durma, não abdique das suas 7 ou 8 horas diárias; tempo com a família e alguma atividade de hobby ou esporte.
A grande dica também é agarrar uma ideia. No final das contas, nunca tive certeza de qual dos dois processos eu deveria priorizar mais, mas mais importante ainda foi eu ter decidido fazer os dois e ter me mantido assim. Decida algo e vá com tudo. A vida é assim, sempre teremos prós e contras e alternativas. Evite pensamentos retroativos. Tenha a motivação lá em cima! Se você tem várias oportunidades e acha que todas fazem sentido para você, a pressão de ‘dar certo’ vai diminuindo, já que se eu não passasse em Yale, iria para a USP e teriam outras universidades americanas também.
Ainda optei por fazer o 1º semestre da FDUSP por estar aguardando a bolsa da universidade de Yale. Estava me prevenindo caso não ganhasse a bolsa, foi realmente o meu plano B. Em relação ao Reino Unido, não consegui a aprovação que tanto desejava, recebi os resultados em novembro e o processo começou em setembro. Foi realmente um ‘baque’ para mim. As duas universidades que mais queria eram Oxford e Yale, e quando recebi a rejeição de Oxford, pensei por um momento: ‘vai ser Brasil’. Após terminar a candidatura para Yale ao final de outubro, foquei ao máximo na FUVEST por medo de a application não dar certo, fazendo os simulados da 2ª fase do vestibular desde 2008. Acredito que seja muito sobre tempo e planejamento. Mas em relação à aplicação, também não dá para se punir tanto quando as coisas dão errado, porque é um processo muito subjetivo e que muitas vezes a pessoa não passa por falta de mérito”.

Sophia e Sarah Borges
Outro exemplo muito interessante é o das irmãs gêmeas Sophia e Sarah Borges, ambas aprovadas para cursar medicina na USP (Universidade de São Paulo), em um dos cursos mais concorridos do país. Sarah também foi aprovada para estudar, no mesmo ano, em Harvard, e ganhou o Prêmio Sophia Freund, mais alta honraria da universidade voltada aos alunos com a maior nota média em seus cursos de graduação. Sophia, sua irmã, ao acabar os estudos na Faculdade de Medicina, foi selecionada para fazer uma pós-graduação na Harvard School of Public Health, e acabou estudando na mesma faculdade onde sua irmã acabou de se formar.
Em meio a uma rotina de preparação para a aplicação e os vestibulares brasileiros, as irmãs criaram o projeto Duo Mentoria, que visa a preparação para vestibulares brasileiros e a aplicação às universidades americanas. Sobre o projeto e a convivência com duas frentes de ingresso ao ensino superior, Sarah comentou em depoimento ao Portal Estudar Fora:
“Conciliar a aplicação para Harvard e os vestibulares brasileiros foi desafiador, especialmente porque os processos têm exigências bem diferentes e eu só decidi aplicar no último ano do ensino médio, depois de assistir vídeos no YouTube de brasileiros que estudavam nos EUA e perceber que esse caminho também podia ser possível para mim.
Algumas dicas são: 1) tenha certeza de que realmente quer tentar os dois e 2) comece a se planejar o quanto antes. Pode ser que, no meio do caminho, você decida priorizar um… e tudo bem, desde que a decisão seja consciente e bem fundamentada. Se eu pudesse voltar atrás, aplicaria para menos universidades, apenas aquelas que realmente atendiam aos critérios que eram importantes pra mim.
Sou muito grata por ter tentado os dois caminhos. Tanto minha breve passagem pela Faculdade de Medicina da USP quanto a graduação em Harvard foram experiências que marcaram minha trajetória. Durante a preparação, organizei meus dias com intenção: de manhã e no colégio, focava nos vestibulares; à tarde e à noite, me dedicava às atividades extracurriculares e à aplicação. A mentoria da BRASA foi essencial para entender o processo e me conectar com outros estudantes, já que eu era a única da minha escola aplicando naquele ano.
Inspirada por isso, eu virei mentora de estudantes brasileiros como voluntária da Associação de Brasileiros de Harvard (HBASS). No meu último ano, eu e minha irmã criamos a Duo Mentoria, para apoiar outros jovens com sonhos ambiciosos que não sabem por onde começar e arrecadar fundos para apoiar o doutorado-sanduíche da Sophia em Harvard.
Também encorajo alunos a buscarem programas de mentoria, como a BRASA ou o Prep Estudar Fora, que são gratuitos. Eles podem ser um divisor de águas nesse caminho, como foi pra mim!”

Sophia também comentou:
“A fase de preparação para vestibulares é um grande desafio, seja para estudar no Brasil ou no exterior. Tomamos decisões importantes muito cedo, e isso pode tornar tudo ainda mais desafiador. No meu ano de vestibulares, prestei apenas provas nacionais, pois sempre tive em mente permanecer no país para cursar Medicina. Fui aprovada na USP, UnB, UNICAMP, Unifesp e UFG, e escolhi a USP, onde comecei a graduação e descobri um grande interesse pela pesquisa e por áreas médicas mais interdisciplinares, como a psiquiatria e, principalmente, a saúde pública.
Pude combinar esses meus interesses e a minha vontade de estudar fora durante a graduação dentro do MD-PhD, um programa que seleciona alunos que já tiveram bom desempenho em pesquisa para fazer a graduação em Medicina e o doutorado. Dentro do programa, busquei a oportunidade de realizar parte da minha pesquisa em avaliação de tecnologias de saúde para o SUS fora do país. Estudar na Harvard School of Public Health era um sonho, e tem sido um período de muito crescimento e aprendizado. Foi incrível poder viver essa experiência ao mesmo tempo em que minha irmã concluía a graduação dela lá.
Eu e a Sarah vivenciamos na prática as dificuldades e incertezas de quem sonha grande e quer ingressar em universidades de alto nível, dentro ou fora do Brasil. Por isso, decidimos compartilhar tudo o que aprendemos para ajudar outros estudantes a se organizarem melhor, acreditarem em si mesmos e se prepararem com mais segurança, por meio do nosso projeto Duo Mentoria. Também buscamos, com a iniciativa, arrecadar fundos para viabilizar minha estadia em Harvard – mostrando que, quando a gente se apoia, sonhos ambiciosos se tornam possíveis.
Acredito que estudar fora ou enfrentar processos seletivos exigentes no Brasil não é só sobre conhecimento, mas também sobre resiliência, planejamento e rede de apoio. Quero que outros jovens saibam que não estão sozinhos e que, com informação e dedicação, podem conquistar oportunidades que transformam vidas”.

Então, é possível se preparar para o vestibular e para a application?
A resposta para a pergunta inicial deste texto é: depende. Apesar disso ser sim possível, existem fatores como:
- A escola em que o aluno estuda (se esta também fornece dentro de sua grade curricular uma excelente preparação para o vestibular e, portanto, ter uma boa GPA significaria ter uma boa preparação para o vestibular)
- Quanto tempo o aluno possui para se planejar (decidir se preparar para os dois caminhos no 3º ano, apesar de não impossibilitar, dificultaria a preparação em relação a uma decisão feita no 2º, 1º ou no 9º do Ensino Fundamental).
- O curso e faculdade que o aluno deseja cursar no Brasil (cursos mais competitivos como medicina e vestibulares mais específicos que não sejam o ENEM exigem mais tempo e dedicação, tornando mais difícil a conciliação com a aplicação).
- E, principalmente, o seu ritmo! Nem sempre todos serão capazes de ter uma rotina sustentável tentando equilibrar todos esses pratos, e isso se torna perceptível ao longo do tempo: se esse for o seu caso, a melhor decisão seria focar em uma frente! E está tudo bem! Opte feliz! Às vezes menos é mais!
- Compreender que, como o exemplo de Sophia demonstra claramente, fazer uma graduação no Brasil não é sinônimo de não ter uma experiência internacional, já que por meio da FMUSP, Sophia conseguiu ter as habilidades necessárias para hoje estudar em Harvard, em uma pós-graduação.
Um pouco da minha trajetória
Em meio a uma família com irmãos que optaram por vestibulares brasileiros, via o meu caminho por osmose também nessa trajetória…mas participei da organização de um evento sobre aplicação na minha escola em 2023 e, principalmente com o contato com as simulações da ONU, vi que uma grande oportunidade me aguardava. Eu poderia enfim me utilizar de tantas feiras, olimpíadas, simulações e várias outras atividades para ingressar na universidade dos sonhos.
Inicialmente tentei equilibrar a preparação para ambas as frentes, mas depois foquei na aplicação, por realmente acreditar no meu sonho. Acredito que a única coisa que não pode interferir nessa decisão é “mirar mais baixo”, não ter ambição. Eu acredito que a virtude do aplicante é justamente a de ser ambicioso, querer impactar sua comunidade. Que alcançar algo grande não seja um obstáculo à sua aplicação, mas sim um incentivo!
A coluna acima foi escrita por Felipe Barreto Távora, participante do Prep Program, preparatório da Fundação Estudar com foco em jovens que desejam cursar a graduação no exterior. Totalmente gratuito, o programa oferece orientação especializada sobre o processo de candidatura em universidades de fora do país. Saiba mais e faça sua inscrição aqui.