Por Alice Pereira, estudante do Prep Program 2025
Adolescentes passam por crises de identidade e autoconhecimento devido às intensas mudanças físicas, emocionais e sociais que ocorrem nessa fase de desenvolvimento, pois é quando a forma como percebem e interagem com o mundo muda de repente.
A busca por autonomia, a pressão para se encaixar em grupos sociais e a necessidade de tomar decisões sobre o futuro profissional contribuem para a instabilidade e a exploração da identidade. Mesmo fazendo parte de grupos sociais, o sentimento de solidão é um dos mais comuns entre os adolescentes que estão passando por sua jornada de autoconhecimento, e eu compartilhei desta realidade.
No meu nono ano, eu costumava entrar em desespero por achar que estava atrasada em relação aos meus colegas de turma, pois todos pareciam já saber o que queriam cursar na faculdade e tinham metas estabelecidas para estudar para o ENEM.
O que mais me incomodava em toda essa situação era o fato de eu não sentir que tinha espaço para descobrir se as coisas que eu me interessava realmente poderiam se tornar uma futura graduação. O desejo de querer fazer cursos diferentes e aulas de diversas áreas no tempo que eu poderia destinar ao estudo para vestibulares me sufocava, por me fazer sentir como se estivesse perdendo tempo. E eu não saía do lugar.
Em meio a esse caos de emoções por ter acabado de me mudar de sala, onde eu fui separada de todos os meus amigos, ter finalmente me adaptado à escola pós pandemia e, em seguida, sofrer outra mudança repentina, eu me sentia um peixe fora d’água em relação aos meus interesses. Foi então que conheci uma pessoa que estava passando pela exata situação que eu, e ainda compartilhava dos mesmos gostos. Era como olhar para um espelho.
Em momentos de crise, é necessário encontrar pessoas com quem você possa se conectar para sentir uma leve parcela de conforto.
Ao passar meses conversando com aquela nova amiga, eu pude enxergar a minha situação por outras lentes: não era o fim do mundo não conseguir definir o meu futuro em um único interesse— essa, na verdade, é a realidade da maioria dos adolescentes. Além disso, todas aquelas pessoas com quem eu me comparava no início, por parecerem resolvidas, começaram a demonstrar indícios de incerteza, pois tinham apenas escolhido um curso pelo qual tinham algum interesse para evitar perguntas como: “E aí, já sabe o que vai fazer na faculdade? O Ensino Médio está próximo.” Apesar de não haver nada de errado nisso, eu não conseguia fazer o mesmo, pois sentia que estaria mentindo para mim mesma.
Como uma pessoa que estuda em uma escola com nenhum acesso a extracurriculares e vinda de uma realidade com barreiras financeiras, o que me dava pouco espaço para explorar interesses, decidi buscar oportunidades online. Quando eu entendi que não podia me prender a só o que eu conhecia e que precisava conhecer mais atividades para entender o que realmente me interessava, encontrei o Girl Up Elza Paxeco, no meu primeiro ano do ensino médio.
Em meio a 80 garotas do Brasil todo, não encontrei apenas um espaço de autodesenvolvimento, mas uma comunidade com garotas que estavam dispostas a compartilhar as suas experiências com as meninas mais novas, assim como eu. Foi como encontrar uma segunda casa, onde eu podia falar com pessoas que já haviam passado por momentos de busca por suas paixões, aprender sobre problemas sociais e estudar no exterior, enquanto preenchia o meu tempo livre com uma atividade útil.
Após alguns meses frequentando as reuniões mensais e aulas da oficina de application oferecida pelo clube, passei a ver a graduação no exterior como algo possível, apesar de distante da realidade da minha família. Através do application, senti que os meus interesses finalmente poderiam ser valorizados e o tempo de preparo para a faculdade poderia ser traduzido em mais horas fazendo atividades que realmente me deixavam feliz, incluindo os que eu descobri através do Girl Up.
Sentindo a liberdade se aproximar, decidi continuar todas as atividades que havia experimentado nos meses anteriores: passei a participar de simulações da ONU e ser reconhecida por elas, fazer voluntariados que me conectava à minha comunidade, e até experimentar atividades completamente novas, como estudos intensos sobre política para participar de rodas de conversa. Mas algo ainda me incomodava.
Eu me envolvi tanto nessas atividades, por gostar genuinamente delas, que as pessoas passaram a me conhecer como alguém que lutava por igualdade de gênero, contra a pobreza menstrual e pela maior participação de jovens nos debates. Isso fazia com que adolescentes em crise de autoconhecimento viessem até mim em busca de dicas sobre como sair daquela situação.
“Mas nem todas as pessoas me conheciam. E como eu poderia ajudar pessoas de outras áreas que não ativismo ou simulações da ONU?” Eu passava horas pensando nisso.
Então, em uma onda de coragem e muita força de vontade, decidi fundar o Agente Jovem, uma iniciativa educacional que promove o acesso a oportunidades educacionais, conhecimento sobre estudos no exterior e extracurriculares, fomentando o desenvolvimento de jovens de baixa renda através de clubes em diversas áreas do conhecimento.
Passei meses convidando as melhores pessoas de cada área que os nossos clubes cobrem, que vão desde estudos políticos à audiovisual, e planejei tudo com muito cuidado para garantir uma estrutura sólida. No primeiro mês, tivemos mais de 300 inscrições para os clubes e mais de 50 para a equipe.
Através do Agente Jovem, diversas pessoas encontraram uma comunidade com jovens engajados na área de seu interesse, espaços para troca de conhecimento, divulgação semanal de oportunidades e, principalmente, recursos que os auxiliam a crescer como indivíduos ativos na sociedade. Hoje em dia, mais de mil jovens já participaram de nossos clubes e mais de seis mil de nossos outros programas (que vão desde newsletter à eventos), mas o objetivo continua o mesmo: oferecer o sentimento de pertencimento a jovens que se sentem perdidos assim como eu me sentia no fundamental.
Os grandes números são resultado do esforço e dedicação de uma equipe inteira com a qual eu trabalho, mas também são um lembrete de que tudo é recompensado quando é feito de coração. Então aqui vai a minha dica: não se contente com um futuro que não te represente. Explore as opções ao seu alcance e sempre vá além da sua zona de conforto. O seu verdadeiro propósito pode estar te esperando depois de um desconforto inicial que, apesar de assustador, será transformador.
Alice é uma estudante apaixonada por mobilização social. Com apenas 15 anos iniciou uma jornada de impacto através de organizações voluntárias em prol da melhora da educação brasileira. Seu maior objetivo é inspirar jovens e criar conexões, como as que a motivaram e marcaram seu próprio desenvolvimento. Nas horas vagas, está sempre debatendo ou lendo novos livros.
A coluna acima foi escrita por Alice Pereira, participante do Prep Program, preparatório da Fundação Estudar com foco em jovens que desejam cursar a graduação no exterior. Totalmente gratuito, o programa oferece orientação especializada sobre o processo de candidatura em universidades de fora do país. Saiba mais e faça sua inscrição aqui.