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Reescrevendo-me: registrar para encontrar a própria voz

 

Por Marcos Santos

Meu Deus, foi eu mesmo que escrevi isso?

Você já se pegou arrumando o seu quarto—provavelmente antes da volta às aulas—achando uma carta de amor super antiga e se envergonhando completamente do seu modo de escrita? Isso é uma progressão!

Dizem por aí que a Inteligência Artificial é a criação mais revolucionária já criada pela humanidade. Porém, tenho minhas ressalvas. O ser humano gosta de criar coisas novas e dizer que se superou de novo e de novo, quando se esquece do que já foi criado.

 

E com a escrita não é diferente. Ela não é nenhuma novidade: para os povos antigos, era tão extraordinariamente útil que acreditavam ter vindo dos deuses! Para os gregos, Prometeu os havia presenteado com essa “arte”. Para os egípcios, o deus Thoth. Para os chineses, Cangjie—inspirado na fênix—criou os primeiros caracteres. 

Entretanto, desde a Idade Antiga, a nossa relação com a escrita mudou completamente. Não vejo pessoas por aí escrevendo Odisseias em versos rimados e complexos. A escrita, que já foi jurídica, religiosa e metódica, tornou-se cotidiana, até banal—para alguns.

Mas não para você, que deseja se aprimorar constantemente, certo?

Parece fácil no papel, eu sei. O tempo todo dizem para escrever poesias, desabafar sobre o seu dia, organizar seus sentimentos. Mas como organizar sua escrita de modo a perceber o seu progresso real?

Costumo dividir a minha escrita em dois segmentos bem definidos: a criativa e a categórica. Elas não se anulam de modo algum, mas se complementam! 

“Eu vou me acumulando, me acumulando, me acumulando—até que não caibo em mim e estouro em palavras”—Clarice Lispector, “Um Sopro de Vida”

A escrita criativa é aquela em que deixo meus pensamentos, ideias e sentimentos fluírem, de modo a conhecer o mais profundo do que estou sentindo. É uma forma de não mentir o que sinto.

Nossos cérebros de caçadores-coletores, que evoluíram para sobreviver na selva, encontram-se perdidos neste mundo com tanta informação e tarefas a serem feitas. É praticamente impossível não se sentir ansioso em meio ao que parece tão caótico. O mundo moderno é muito barulhento: há dias em que nem ouvimos a nossa própria voz. Às vezes, faz bem parar e escutar.

Por isso, uso meus cadernos como meu “segundo cérebro”. Muitas vezes, nossos sentimentos não cabem em nós.

Lembre-se, porém, que não basta apenas escrever. Vivemos numa época em que temos o privilégio de poder refletir sobre a escrita! Já não mais escrevemos apenas sobre leis ou para contabilizar a colheita anual. 

Quando tive de escrever algumas das minhas “essays”—redações que enviamos para as universidades no processo de candidatura—foi natural buscar os desabafos e poemas que já tinha escrito. Era como se eu visse o mais intenso e real da minha essência. 

Construir um perfil autêntico e uma narrativa única é extremamente importante no processo de application. Isso só é possível se você se conhecer verdadeiramente: como mostrar que você é a pessoa certa para a universidade se você não conhece a sua essência? Revisitar os textos já escritos e refletir sobre eles talvez seja mais importante do que escrevê-los!

A reflexão, na verdade, é o que gera a mudança. A escrita é “apenas” a forma de organizar e de perceber que a mudança tem que acontecer—ou que já está acontecendo.

Isso a IA não pode fazer por você.

“Eu não escrevo em português. Escrevo eu mesmo.”—Fernando Pessoa, “Livro do Desassossego”

A maior beleza da escrita é que—embora antiga, ou provavelmente por isso—ela funciona! A escrita vem sendo aprimorada durante milênios de história; ela é a ferramenta mais eficaz de organização que existe! 

Embora não ocorra de forma tão convencional, o objetivo da minha escrita categórica, nesse caso, é organizar a minha rotina para avaliar o meu desempenho e, com isso, enxergar o meu progresso. 

Mas em um mundo infinito de sites e apps de organização, quais utilizar?

Primeiramente, a tecnologia veio para ficar; então use-a ao seu favor! Notion, Caderno, Google Keep, Sheets e Calendar e o famoso grupo consigo mesmo no Whatsapp. As possibilidades são inúmeras! Sugiro que teste cada uma delas e identifique aquela—ou aquelas—que mais combinem com o seu estilo de organização. 

Tenha planilhas! No processo de application—ou em outros momentos estressantes—é muito fácil se autossabotar: achar que um resultado ruim isolado é suficiente para anular todo o seu progresso. Quando você registra a sua evolução de forma organizada, você começa a perceber que os “dias ruins” não significam tanto. A evolução continua.

Além disso, separe meia-hora diária—por favor, coloque o seu celular em outro cômodo—para escrever num caderno específico “no que posso melhorar amanhã?”, “no que melhorei hoje?” e “como estou me sentindo?”. Sinta-se à vontade para divagar sobre os seus sentimentos na última pergunta, mas tente ser mais objetivo nas duas primeiras, pois você poderá revisitá-las rapidamente para checar o seu progresso!!

Tire, também, um dia da semana (recomendo o domingo!) para planejar o resto da semana, considerando os imprevistos. Não se esqueça de refletir sobre a semana anterior, com base nos textos diários. 

Coloque metas realistas! Não tente abraçar o mundo todo, especialmente em um único dia. 

Por fim, não abra mão ainda do bom e “velho” papel! Tenho vários cadernos espalhados pela casa. Se eu tenho uma ideia ou me lembro de algo importante, imediatamente anoto no caderno mais próximo, da forma mais crua. Depois, junto-as, já processadas e organizadas, na ferramenta que uso para aquele tópico.

Síntese com dicas concretas:

  • Reflexão diária num caderno específico (pelo menos meia-hora);
  • Dia do planejamento + reflexão (ex.: domingo à tarde);
  • Lista de prioridades: liste todas as atividades—primeiramente de forma desorganizada—que você lembra que precisa realizar. Depois, ordene-as em ordem de prioridade com base em facilidade e data de entrega;
  • Mapa mental: você também pode organizar as suas prioridades de forma visual por área (ex.: diferentes matérias da escola, atividades extracurriculares e tarefas de casa);
  • Deixe seu calendário (impresso, para que você possa riscá-lo) visível no seu dia a dia.

Dedicatória

Dedico este texto, primeiramente, à minha mãe Daniela Barreto, que—com suas milhares de agendas—me inspirou a documentar absolutamente tudo que faço, devo fazer e sinto. Também o dedico à minha professora de biologia Valéria Mafra, que reforçou o quanto organizar meu planejamento no papel pode me ajudar a visualizar o quanto venho evoluindo. Por fim, dedico-o à minha orientadora Milene Cecília, que me ensina a compreender os meus sentimentos—ao invés de lutar contra eles.


 

Vejo a ciência como tradução: inconformidade em hipótese, hipótese em ação. Sou Marcos, medalhista internacional e cofundador do Projeto Sapiens, que incentiva jovens a se desafiarem em olimpíadas científicas. Entre violinos e versos, ordeno perguntas que me perseguem. Afinando cordas ou calibrando pipetas, busco respostas que também transformem vidas.

 


A coluna acima foi escrita por Marcos Paulo, participante do Prep Program, preparatório da Fundação Estudar com foco em jovens que desejam cursar a graduação no exterior. Totalmente gratuito, o programa oferece orientação especializada sobre o processo de candidatura em universidades de fora do país. Saiba mais e faça sua inscrição aqui.

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