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Aluno de Harvard compartilha redações que o ajudaram a chegar lá

Nathalia Bustamante - 26/01/2016
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Por Nathalia Bustamante

O capixaba Gabriel Guimarães decidiu no início do ensino médio que queria fazer sua graduação nos Estados Unidos. Então, não trocou mais nenhuma palavra em português com sua irmã mais nova, que também compartilhava do seu sonho. Oito anos se passaram e, hoje, ele estuda Ciências da Computação e Economia na Universidade Harvard e foi eleito pela Business Insider um dos 19 alunos mais brilhantes da instituição.

Leia a redação que ajudou jovem a ser aceito em Harvard e Stanford

Foi um longo caminho para chegar até lá: ainda no ensino médio, enquanto estudava Eletrotécnica no Instituto Federal do Espírito Santo, Gabriel se deparou com o CS50, um curso online introdutório a Ciências da Computação de Harvard. Encantado com tudo o que aprendeu, decidiu compartilhar a oportunidade com colegas que não tinham domínio do inglês. Com a autorização do professor responsável pelo curso, traduziu, adaptou e criou o CC50, a versão em português do CS50, que está disponível online até hoje.

Esta é uma das experiências que Gabriel relatou nas redações (as chamadas essays) que enviou a Harvard no processo de candidatura (application). Essas redações são parte fundamental do processo de seleção para universidades americanas – é através delas que o candidato tem a chance de, além de se apresentar, falar sobre seus interesses e realizações. Outro essay compartilhado por ele fala sobre o aprendizado de alemão e como isso mudou seu modo de pensar.

As redações de Gabriel falam muito sobre ele: sua curiosidade, seu desejo de aprender e compartilhar conhecimento, sua dedicação e versatilidade. Como história de fundo, também falam sobre suas conquistas e expectativas. Ele compartilhou os dois textos com o Estudar Fora – que os traduziu para português – a fim de ajudar mais pessoas a chegarem mais longe. Veja abaixo e inspire-se:

As versões originais em inglês podem ser baixadas aqui

CS50

Se meus alunos aprenderam muito comigo, eu certamente aprendi muito mais com eles

Normalmente, eu levaria uma hora para preparar uma aula.

Eu já tinha passado ao menos seis horas encarando a tela do computador. Esta era a última aula que eu precisava preparar e queria fazer algo especial. Estava reunindo fotos e partes de filmes para montar um vídeo curto, mostrando os destaques de CC50. Minha esperança era que, enquanto assistiam a este vídeo, meus estudantes percebessem o quanto eles haviam aprendido sobre Ciências da Computação durante aquelas 11 semanas.

Na verdade, agora eu percebo o quanto eu mesmo aprendi com este projeto. Ao final de 2011, eu tinha acabado de concluir o curso introdutório a Ciências de Computação de Harvard (CS50) através do seu website, e estava deslumbrado por tudo o que aprendera. Na época, eu já possuía algum background em Ciência da Computação e pouca experiência com ensino, mas o mais importante era essa ideia que não me abandonava: eu precisava trazer esta oportunidade para os meus colegas. Este desejo me levou a estudar e aprender mais sobre tudo o que eu precisaria para criar a infraestrutura de um curso e começar a ensinar CS50 no Brasil – com o nome que traduzi, literalmente, para CC50.

Após duas semanas quase ininterruptas de pesquisa e programação, eu já tinha meu website no ar e rodando. Ficava mais ansioso a cada dia. Funcionaria? Minha escola aceitaria a ideia? E, se sim, será que os estudantes estariam interessados? Bom, ao menos a última questão foi respondida rapidamente. Eu mal posso descrever minha empolgação ao ver os números: mais de 90 pessoas registraram para o curso em cinco dias. Eu havia pensado em 15 estudantes… talvez 30. Mas 90 era completamente acima das minhas expectativas.

Olhando os vídeos, eu posso ver claramente a diferença entre o rapaz de 17 anos que tremia nervosamente na primeira aula, fingindo ser um professor, e o mesmo rapaz depois de 11 semanas, divertindo-se

Em 22 de agosto de 2011, eu finalmente me vi em frente a uma classe cheia de estudantes, cujas idades variavam de 14 a 40 anos. Após o discurso do Diretor e um café de recepção, era minha vez. Todas aquelas pessoas me encaravam, acreditando que eu poderia ensinar algo a elas. Naquele momento, eu não tive escolha a não ser colocar todas as minhas dúvidas de lado e perguntar: “Então, vocês sabem o que é Ciência da Computação?”

Se eu lhes tivesse dado tempo suficiente, a resposta seria provavelmente um retumbante “não”. Com a passagem das semanas, no entanto, os estudantes começaram a criar seus primeiros programas de computador e seu interesse pelo assunto tornou-se mais e mais palpável. Mas era apenas o começo. Por volta da sexta semana, aqueles mesmos estudantes compartilharam da minha alegria quando recebemos a notícia de que o professor de Harvard David Malan me havia enviado uma carta de reconhecimento pelo trabalho com a CC50 e colocou um link para a minha página no site original da CS50.

Finalmente, na 11ª semana, muitos dos estudantes dominavam diversos conceitos complexos como Hash Tables e ciência forense digital. Ainda me lembro da ocasião em que um deles se aproximou e me disse “Muito obrigado, professor! Eu aprendi muito mais Ciência da Computação com a CC50 do que no meu primeiro ano de faculdade!”

Se meus alunos aprenderam muito comigo, eu certamente aprendi muito mais com eles. Agora, olhando os vídeos, eu posso ver claramente a diferença entre o rapaz de 17 anos que tremia nervosamente na primeira aula, fingindo ser um professor, e o mesmo rapaz depois de 11 semanas, divertindo-se e se sentindo em casa enquanto ensinava.

Agora, mais de 100 alunos já se formaram em CC50. Muitos deles estão começando a criar seus próprios aplicativos, projetos, até mesmo empresas. Minha caixa de entrada se enche todos os dias com dúzias de e-mails de pessoas de todos  os cantos do país que estão cursando CC50 online. Bom, acho que essas são as razões pelas quais tentar resumir tudo o que CC50 significou para mim em um vídeo de 3 minutos foi uma tarefa tão difícil. Mas, pelos meus estudantes, eu precisava tentar.

 


Aprender Alemão

“Mama, ich habe auf Deutsch geträumt!” Eu gritei para minha host-mãe enquanto corria escada abaixo, me sentindo quase excitado demais para falar. Eu havia sonhado em alemão. Um sonho bobo sobre voar para a Áustria em um pequeno avião com amigos, mas ainda assim, meu primeiro sonho em alemão!

Dois meses antes, pouco depois de ter colocado os pés pela primeira vez na Alemanha, eu senti algo que depois descreveria como uma das piores sensações que já tinha tido: o sentimento de não ser capaz de entender as pessoas. Ainda consigo me enxergar claramente em um daqueles incontáveis momentos em que me sentei com amigos e todos falavam, brincavam, riam, e eu literalmente só ficava sentado, encarando o nada e me sentindo culpado demais para roubar o momento de diversão de uma daquelas pessoas apenas para satisfazer meu desejo egoísta de entender.

Esse é, de verdade, o fator que mais me motiva a perseguir uma educação em Harvard: a possibilidade de aprender, não apenas conteúdos acadêmicos brutos, mas também – e mais importante – novas formas de pensar

Finalmente, o sonho sobre o avião austríaco veio, e com isso a percepção súbita de que eu já era capaz de pensar em alemão. A estrutura gramatical, a colocação dos verbos, a liberdade de criar palavras estão entre as muitas coisas que fazem esta língua única. Quando estudava outras línguas latinas, como espanhol e italiano, por exemplo, eu dedicava a maior parte do meu tempo para aprender uma função bijetora ligando cada palavra em português a outra na nova língua, mas a estrutura das ideias, e mesmo a ordem das palavras, permanecia a mesma.

Aprendendo alemão, por outro lado, era um conceito completamente diferente – eu realmente precisava pensar diferente apenas pela linguagem que usava. Por exemplo, em alemão, o verbo principal deve, com frequência, ser a última palavra da frase. Inicialmente, eu tive muitos problemas com frases longas, em que eu precisava adivinhar qual seria a ação principal apenas com base no contexto. Se não o fizesse, me arriscaria a esquecer boa parte dos detalhes até que a pessoa finalmente chegasse ao verbo. Ao ser forçado regularmente a usar estas construções, eu passei a prestar atenção a algumas sutilezas do inglês e português que eu nunca haveria reparado sem esta nova forma de pensar que o alemão me ensinou.

Neste momento, pode-se perguntar por que eu não senti o mesmo com o inglês. Bom, provavelmente tem algo a ver como o fato de ter tido contato com a língua através de músicas, filmes e internet desde muito jovem. E, apesar das reclamações dos meus pais, há quase quatro anos eu não falo uma palavra em português com a minha irmã mais nova: desde que nós dois decidimos cursar faculdade nos Estados Unidos, nós só nos falamos em inglês. Além disso, eu acredito que, embora inglês seja muito diferente do português no que diz respeito a vocabulário e gramática, quando se trata da maneira pela qual ideias são expostas, inglês e português não são tão diferentes assim. Alemão, por outro lado, me força consistentemente a criar cadeias de pensamento que jamais fariam sentido em nenhuma das outras línguas.

Atualmente, eu continuo lendo livros e assistindo a filmes em alemão, e ainda uso este “modo alemão de raciocinar” regularmente quando abordo diferentes problemas e conceitos nos mais variados assuntos, de matemática a conversas diárias. Esse é, de verdade, o fator que mais me motiva a perseguir uma educação em Harvard: a possibilidade de aprender, não apenas conteúdos acadêmicos brutos, mas também – e mais importante – novas formas de pensar.

As versões originais em inglês podem ser baixadas aqui

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Sobre o escritor

Nathalia Bustamante
Nathalia Bustamante
Nathalia Bustamante é jornalista formada pela UFJF. Foi editora do Estudar Fora entre 2016 e 2018 e hoje é coordenadora de Conteúdo Educacional na Fundação Estudar.

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